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sexta-feira, novembro 22, 2024

Comunidades unem iniciativas para preservar as águas do cerrado

A partir de um olhar atento para as águas que ligam Planaltina à Lagoa Formosa, em Planaltina de Goiás, e da importância das regiões para a preservação do cerrado, moradores das duas cidades decidiram unificar projetos de incentivo à preservação ambiental

Sair dos muros da residência e entender a realidade dos arredores sempre é uma grande oportunidade socioeducativa. A cada dia, milhões de pessoas no mundo estão aderindo às causas em prol do planeta, tentando conscientizar a sociedade para o desenvolvimento sustentável. Foi a partir de um olhar atento para as águas que unem Planaltina, no sentido de Águas Emendadas, à Lagoa Formosa, em Planaltina de Goiás, da importância das regiões para a preservação do cerrado, que moradores das cidades do DF e de GO decidiram unir projetos de incentivo à preservação. O movimento, que já reúne cerca de sete grupos, tem o intuito de melhorar a comunicação entre os ativistas das duas regiões, que fazem grandes trabalhos em defesa das águas do bioma.

Desde sistemas agroflorestais, ecoturismo, artesanato, produção orgânica, ou, até mesmo, gastronomia, moradores de Planaltina e de Planaltina de Goiás têm promovido a economia criativa por meio de uma forma sustentável. “O que percebemos é que há pouca comunicação e articulação entre essas pessoas. Então, queremos imitar a natureza, ou seja, criar um ecossistema onde essas iniciativas se conectem, se protejam, se ajudem, cresçam e deem frutos admiráveis e que beneficiem toda a sociedade”, pontua Marcelo Benini, especialista em comunicação socioambiental e coordenador dos Guardiães das Águas Emendadas (GAE), uma das entidades responsáveis pela iniciativa.

Segundo Marcelo, juntar as duas Planaltinas surgiu da necessidade de interromper as divisas e melhorar a comunicação entre as duas áreas que estão ligadas pelas águas e que precisam de mais cuidado e atenção por parte do governo. O especialista explica que a cidade de Planaltina de Goiás vem se expandindo na direção da divisa norte com o DF, onde já foram implantados vários bairros: Brasilinha 16 e 17, São Francisco 1 e 2, além de novas áreas em implementação. “A divisa está a menos de 7km da Estação Ecológica de Águas Emendadas. Portanto, o adensamento da população pode acarretar perdas graves e irreversíveis para a Estação Ecológica e sua área de amortecimento de impacto ambiental, onde estão os núcleos rurais Bonsucesso e Quintas do Maranhão, ambos no DF, em áreas rurais ainda relativamente bem preservadas”, diz.

Agora, a iniciativa ainda está em processo de convocação de participantes. “Estamos reunindo as pessoas, e convidamos todos aqueles que podem contribuir de alguma forma a se unirem a nós. Pretendemos fazer a primeira reunião geral de trabalho no mês de abril”, diz. A partir disso, os envolvidos em diferentes projetos devem se conectar e unir objetivos. “Vamos conhecer as memórias, os saberes, as ações de cada um e estabelecer pontos de articulação. A partir daí, gerar uma voz comum, agregadora, que aja em prol da valorização da vida humana nos seus aspectos econômicos, ambientais e sociais”, complementa Marcelo.

Após isso, o especialista diz que novos projetos devem ser criados. “Vamos criar projetos sempre pautados em economia criativa e sustentabilidade, e vamos atuar fortemente junto ao poder público do DF, Goiás e federal, propondo soluções e cobrando políticas públicas e atuação permanente dos responsáveis pela preservação do patrimônio natural da região”, diz. De acordo com Marcelo, o intuito é que o movimento chame a atenção das populações e dos agentes públicos da região. “Queremos que haja uma grande mobilização para tornarmos a área rural norte do DF e a região de Planaltina de Goiás exemplos de preservação e boa convivência entre o homem e a natureza”, reitera.

A Bamburiti é uma das empresas que dão esse exemplo. Vitor Hugo Moraes de Lima, 36 anos, dono do negócio explica que a iniciativa é uma empresa de soluções sustentáveis, que trabalha com tecnologias e produtos com a utilização do bambu e fibras naturais, com preceitos da agroecologia e da permacultura. O trabalho é exercido há 10 anos, com o objetivo de beneficiar a natureza e o homem. “A Bamburiti nasceu da paixão pela arte e da motivação de associar design moderno a materiais naturais. Produzimos bicicletas de bambu sob medida, ajustáveis para as medidas biométricas do ciclista: em qualquer nível, modalidade e tipo de bicicleta desejada”, pontua.

Sobre a conservação do meio ambiente por meio do uso consciente dos recursos naturais, Vitor vê a educação como ponto-chave. “Somos o meio em que vivemos. Temos que reeducar a sociedade a ter empatia ao seu ecossistema mais próximo. No momento, isso parece invisível por entre as lentes dos dispositivos móveis. Colocamos nosso trabalho em destaque em outros cenários, trazendo informações para um público que antes não havia se atentado às questões ecológicas. Com as bicicletas de bambu, se pode fazer uma intervenção de educação ambiental naturalmente”, comenta.

Importância

O administrador da Unidade de Conservação de Águas Emendadas, Gesisleu Darc Jacinto, explica a importância de ações como estas. “Uma unidade de conservação depende muito da qualidade da sua zona de amortecimento. Por isso, quanto mais armazenada a sua zona estiver, menores serão os impactos negativos para essa unidade”, ressalta. Águas Emendadas está situada entre a expansão urbana e área rural, onde as atividades impactam diretamente na qualidade da sua preservação. “Então, as atividades conservacionistas desenvolvidas nessas áreas resultam em benefícios à estação ecológica”, pontua Gesisleu.

De acordo com o coordenador, a região vem sofrendo impactos negativos sem precedentes com a ocupação desordenada. “Planaltina de Goiás tem um crescimento absurdo em direção à região de Planaltina-DF. Há uma fomentação em relação ao crescimento desordenado da região, onde estão localizados núcleos rurais que estão na zona de amortecimento de Águas Emendadas”, esclarece.

Segundo Gesisleu, o parcelamento irregular da zona rural forma vilas especiais que aumentam muito a demanda por água. “A perfuração de poços prejudica muito o lençol freático, e a consequência disso é a redução de quantidade de água nas nascentes, localizadas dentro da estação. Além do desmatamento da vegetação, que traz todo um prejuízo para a zona silvestre rural”, reitera. Por isso, a importância de ações que visam preservar essas áreas. “Elas são de suma importância para a manutenção das nossas nascentes dentro de Águas Emendadas. Nesse sentido, o trabalho que a GAE vem realizando na região deve ser incentivado, porque, assim, poderemos evitar um futuro desastroso.

Além da GAE e da Bamburiti, até o momento, participam do movimento a Ecovila da Lagoa, a propriedade Quinta dos Pirilampos e os projetos Planaltina Goiás Verde, Árvore da Amizade e o grupo de Caminhadas de Brasília. Todos unidos por um bem comum: a preservação das águas. Isso porque é no cerrado que nascem as principais bacias hidrográficas do continente sul-americano. Nele, ocorrem as mais ricas diversidades de flora e fauna. Muitas populações sobrevivem de seus recursos naturais, incluindo etnias indígenas, quilombolas, geraizeiros, ribeirinhos, babaçueiras e vazanteiros.

Ailson José Rocha Juno, 44 anos, é dono da Ecovila da Lagoa, uma localidade própria para o ecoturismo na região que participa do movimento. O trabalho com sustentabilidade vem desde 2008, destacando o impacto da presença em um ambiente natural, como destaca o proprietário. “A forma de conservar o meio natural não é somente por estar no ambiente natural, mas entendendo como você mesmo é responsável pelo lugar. Assim, se entende a dinâmica da natureza, aplicando isso no dia a dia. A sustentabilidade não está nos materiais, mas sim na conduta: um ambiente natural incentiva uma conduta mais responsável. E essa é a ideia com a Ecovila”, ressalta.

O proprietário diz que a ideia da Ecovila surgiu após uma experiência que vivenciou na Europa e sentiu isso como “algo libertador”. “Quero proporcionar isso para mais pessoas: com alimentação orgânica e separação de lixo correta se pode fazer uma vida melhor”, diz. Sobre o comportamento sustentável, Ailson alega que não deve ser algo imposto, mas incentivado. “Isso pode ser vivenciado mesmo em grandes cidades, como na Europa: com hortas em quadras, plantações urbanas, mesmo encontros para discutir construções mais sustentáveis. Essa consciência é possível sem que seja imposta, e referências não faltam. Mesmo o convívio com as pessoas contribui para a sustentabilidade. A responsabilidade é com a natureza humana, em cada ação, e não só com o meio ambiente, mas com cada um que convivemos”, observa.

A ideia tem continuidade na Quinta do Pirilampos, com o dono, Sérgio Saretto, 44, que aplica a agrofloresta. “Com esse conceito e com o solo mais rico, por ter mais matéria orgânica, naturalmente se tem essa qualidade passada aos produtos: são frutos mais doces e com mais propriedade, principalmente por não haver a necessidade de uma produção tão rápida e que não faça uso de produtos orgânicos. A agrofloresta em larga escala melhora a aparência, sabor e riqueza do produto, além da qualidade do terreno onde este é plantado”, define.

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